terça-feira, 9 de novembro de 2010

Egungun Ancestralidade, minha, sua de todos...

Egungun Ancestralidade.

De acordo com o Corpus literário de Ifá, Orí reside alternativamente na terra (àiyé), onde somos conhecidos como ará àiyé (habitante da terra) e no Òrun, espaço ancestral, onde somos conhecidos como Ará Òrun, ou cidadão do Òrun. Sendo assim, podemos concluir que a crença na ancestralidade esta baseada em dois conceitos extremos:

Aiyé - mundo concreto

Orun - espaço ancestral

É sabido por todos, que o seres humanos têm sua origem ligada a um destino que começa a ser determinado no momento da fecundação, e que, sendo assim, o mesmo passa por dois estágios, nascimento e morte, ou seja dois nascimentos, uma vez que na concepção yorùbá, a morte não é o fim e sim, apenas o inicio de um novo ciclo.

O Emí (função vital que interage junto a Orí) perpetua-se uma vez que o mesmo está associado ao nosso duplo no Òrun (egbé Òrun), sendo assim independente de que ciclo o Emí esteja associado, o mesmo circula entre o Òrun e o Àiyé, criando um movimento e assim a possibilidade de manutenção concreta da energia ancestral.

Sendo assim, podemos concluir que sem a presença de Orí, e também do Emí, tornasse sem sombra de dúvidas, impossível cultuarmos a ancestralidade

Babá Egúngún Olomo ki nsun o

Maa sun ki o maa gbagbe Ile

Ma fi owo digi Igbagbe mu lorun.

Um Ancestral que possui filhos e devotos não dorme

Não dorme e não esquece sua casa

No Òrun meu pai, jamais abrace a árvore do esquecimento

(Jamais se esqueça das pessoas que te louvam).

Independente da idade do Babá Egún, com certeza, o mesmo para ser assentado necessitou de Àse pessoais da pessoa a qual aquele ancestre trará proteção e o seu culto na comunidade fez com que com o passar do tempo o mesmo abençoasse seus devotos, saindo apenas do âmbito familiar.

Então faremos a clássica pergunta , se Babá Egún está ligado a ancestralidade individual, como o mesmo pode abençoar mais de um devoto ? e também como seria possível um Ojé invocar e evocar seu Babá Egún independente do local que se encontre ?

A resposta a essa questão é muito simples e se encontra presente em uma parte de um determinado Oríkì direcionado a Babá Egún:

Mo ri akuko kan soso bo igba egungun

Eu tenho um único galo para oferecer a 201 egungun

Iba eni soje ki nto mora sé

Edun gbonraganda

A gbe aye gbe oru

O grande venerável que vive entre os vivos e os mortos

que se dobra em milhares de partes

cidadão vindo do Òrun distante

Em relação ao fato de um Babá Egún ser assentado somente em último caso em uma casa de Òrìsà, acontece uma discordância dentro da tradição africana por diversos fatores:

1) A ancestralidade e algo concreto , enquanto existir o homem, tempo e desejo, existirá o culto a Baba Egún. Em outro oríkì de Babá Egún, dizemos que por mais problemas que tenhamos, nós que temos nossos ancestrais no Òrun estamos tranqüilos, pois todas as nossas aflições e a solução das mesmas se encontram nas mãos de nossos Babás.

2) É necessário entendermos as diferenças entre iniciação e assentamento:

Iniciação: Despertamos nos seres humanos características que já se encontram presentes em nosso Orí.
Assentament
o: Buscamos suprir algo que não esteja presente em nossa essência.

Sendo assim, o culto a ancestralidade é algo presente na vida dos seres humanos, uma vez que um ser humano sem seus ancestres é o mesmo que uma árvore sem raiz. O fato de que todos podem e devem cultuar sua ancestralidade, seja para buscarem maior movimento em sua vida, seja apenas para agradecermos aos ancestrais a oportunidade de estarmos vivos, seja pelo simples fato de estarmos em contato com energias que foram de suma importância para manutenção de nossa família, nada têm a ver com a questão dos mesmos poderem ou não se tornar sacerdotes de Babá Egún.

Oku olomo ki nsun, o di owo baba mi lorun.

Um ancestral não dorme, não esquece as pessoas que deixou para traz; a solução de todas as dificuldades em minha vida está nas mãos de meus ancestrais no Òrun

Acredito que ao avaliarmos os acontecimentos e a estruturação do Culto a Babá Egún na diáspora, seja ela brasileira ou cubana, devemos em um primeiro momento separarmos fundamentos religiosos e condicionamento cultural.

Acredito que pessoas que vieram antes de nós, fizeram o possível para que nossas tradições se mantivessem através dos tempos e o fato de eu, particularmente, ter optado por seguir o Culto Tradicional em momento algum tira meu respeito, conhecimento e admiração pelas nossas tradições e conseqüentemente pelas pessoas que lutaram para que ela se perpetuasse.

Porém, reconheço que muito se perdeu. E a falta de determinados conhecimentos fez com que um certo misticismo criasse um determinado temor para justificar muitas práticas.

Aqui dizíamos, até muito pouco atrás, que mulheres não participam do culto a Babá Egún, mas podemos perceber em um dos mais variados Oríkì - Ewi - Esa justamente o contrário:

Bi obinrin mo awo

Bi okunrin mo awo

ko gbodo wi

ko gbodo fo

ko gbodo so

Egungun ile Egbe Ijo Agboniregun ooooo

Omo a reku , tosi nu

Odun Baba wa la nse o

Igba yi a gbe wa

A mulher que conhece o segredo, não deve revelá-lo

O homem que conhece o segredo, não deve revelá-lo

Eles não devem abrir a boca

Eles não devem falar

Chegou o Egúngún da Egbé Ìjo Àgbonìrègún

que venerando seus ancestrais afasta a pobreza e a doença

estamos venerando nosso pai,

esse tempo nos será favorável.

Aqui dizemos que não se pode tocar em Babá Egún, que o contato com a roupa e prejudicial, mas o que vemos em território africano e totalmente diferente.
Babá Egún com crianças no colo, abraçando seus filhos e devotos, muitas vezes inclusive, louvando, e pedindo proteção a crianças:

Egungun ile Egbe Ijo Agboniregun ooooo

omo lagbaja re o

ma je iku o pa o

ma je arun o se

je o dagba

ki o gbeyin baba ati iya

ki o se ori re

ma je oso , ologun ika o ri pa

ma je aje ologun ika o ri pa

Egúngún da Egbé Ìjo Àgbonìrègún ooooooo

aqui esta o filho de :

proteja-o contra a morte

proteja-o contra a doença

ajude-o a viver bastante

que ele não morra antes dos pais

que tenha muita sorte na vida

proteja-o para que não seja destruído pelos feiticeiros

proteja-o para que não seja destruído pelas feiticeiras.

Em momentos de dificuldade, crises familiares co-sangüíneas ou religiosas, Babá Egún, muitas vezes atuam como juízes, uma vez que os envolvidos são levados a sua presença e após a apresentação e correta evocação, são feitos os relatos do ocorrido.

As citações acima mostram a influência e a importância da ancestralidade nas relações sociais e cotidianas. Um ancestral insatisfeito com comportamentos sociais inaceitáveis, como adultério, desrespeito aos mais velhos, transgressões de interdições ou o não cumprimento de leis que regem a vida social do povo, muitas vezes atua como conselheiro avaliando as situações e aconselhando seus filhos e devotos para que a ordem seja restabelecida.

Além de prestar auxílio ligado à ordem social, os ancestrais são evocados para auxiliar no progresso da agricultura, garantindo chuvas e boas colheitas, etc... .

E impossível avaliarmos os acontecimentos passados para que possamos entender por que o Culto a Babá Egún foi desassociado do Culto a Òrìsà. Mas devo mencionar que o mesmo ocorreu com o Ifá.

Na Nigéria e no Benin, esses cultos não são diferentes, interagem juntos, são partes de um todo e a verdade maior disso tudo está na Igbá Odù ou cabeça da existência, representando os dois espaços, Ceu e Terra, Òrun e Àiyé e as divindades e manifestações energéticas que interagem em conjunto.

Em meu ponto de vista é impossível falarmos de nossa religião, sem darmos aos ancestrais o verdadeiro papel que eles merecem. Ancestrais não devem ser temidos, devem ser amados e louvados, e nós sacerdotes capacitados para trazermos o conhecimento e a liturgia ancestral devemos nos conscientizar assim como os demais praticantes, a importância de ter acesso as possibilidades criadas ao estarem em contato com os mesmos.

Não existe diferenciação dos Babá Egún cultuados na Ilha , dos cultuados no Benin ou na Nigéria, ou mesmo os que podem vir a ser cultuados nos Ile Lesé Òrìsà, existe a necessidade de conscientizarmos e prepararmos sacerdotes para que possamos lhes render homenagens.

ORIKI

Iba nbe lenu mi o o

Ase si nbe lowo ara orun

e maa je iba o wun wa o o

ase te fun wa , oun la nlo

bi o ba si ato ase ki ndomo

bi o ba si ase ato ki ndomo o o

awa lase

enyin lato

awa lato

enyin lase

A forma correta de saudar esta em minha boca

O àse está junto ao venerável cidadão que vêm do céu

permitam que minhas saudações sejam favoráveis

estou evocando o àse que você nos deu

Sem o poder do sêmen o ovulo não fecunda

sem o poder do óvulo o sêmen não fecunda

Vocês são sêmem

nos somos os óvulos.

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